segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Tua: Linha reabre após acidente e autoridades apostam na viabilidade turística

Tua, Bragança 28 Jan (Lusa) - Armindo Augusto, passageiro habitual da linha do Tua, hoje viajou de graça por ter sido o primeiro e único a fazer a viagem na sua reabertura, depois do acidente de 12 de Fevereiro.

"Hoje pode ir de graça", transmitiu-lhe o revisor, mas este idoso viajaria de qualquer forma.
"Eu, medo?", devolve a pergunta sobre os receios da primeira viagem depois do acidente que matou três ferroviários e que fechou a linha entre a Brunheda e o Tua durante quase um ano.
Na noite anterior ao acidente, Armindo tinha feito o mesmo percurso para S. Lourenço, apenas para "beber um copo".
Não fosse o facto de a carruagem ir cheia de jornalistas, o acidente era algo de que ninguém queria falar.
A linha foi toda reabilitada nesta extensão e a própria intervenção identifica o local do acidente com barreiras de sustentação.
Taludes e redes seguram a ravina de onde desabaram as pedras que fizeram descarrilar ao inicio da noite de 12 de Fevereiro uma carruagem do metro de Mirandela com cinco pessoas a bordo.
A poucos metros do local, as esculturas naturais em rocha, que conferem a particularidade da paisagem da linha considerada das vias estreitas mais belas do mundo, poderiam ter evitado a queda por uma ravina de 60 metros em direcção ao rio.
O administrador delegado do metro que faz o serviço para a CP, Milheiro de Oliveira, explicou hoje o acidente.
Segundo disse, a carruagem ficou 13 metros à frente do buraco feito pela primeira pedra que desabou sobre a linha.
Uma segunda pedra terá sido a causadora da tragédia ao empurrar o veículo.
Os inquéritos ao acidente estão concluídos e a linha reaberta, mas falta o Ministério Público de Mirandela pronunciar-se sobre eventuais responsabilidades criminais no âmbito de um inquérito ainda em curso.
Mesmo para quem viaja frequentemente neste local, cada passagem é sempre diferente e hoje a expectativa maior.
"É aqui", ouvia-se de várias vozes quando a automotora do metro de Mirandela chegou ao local do acidente depois de Castanheiro do Norte.
Aqui a paisagem parece justificar a expressão que a identifica como "o belo horrível".
O rio revoltado ao fundo de uma ravina de fragas e a escarpa de onde desabaram as pedras ganha uma maior imponência.
Fernando Pires, que não é maquinista mas agente de condução, não tem receio, diz que "há mais acidentes nas estradas do que nas vias férreas".
A ele e a outros colegas cabe agora a responsabilidade de terem que circular em marcha à vista, uma velocidade que lhes permite parar antes de qualquer obstáculo.
A diferença não é grande, agora a velocidade máxima é de 30 quilómetros, antes do acidente era de 45.
A carruagem saiu da estação de Mirandela as 10:00 e chegou ao Tua minutos antes das 12:00.
O condutor Pires não acha "que a via seja mais perigosa que outras" e 12 anos depois de viajar por estes carris continuam a operar com a tranquilidade de quem acha que "tudo é o que tem que ser".
Na noite de 12 de Fevereiro, um colega fazia o percurso contrário do Tua para Mirandela e circulou menos de um quarto de hora até ao local da tragédia.
Pensou-se que seria o fim da linha do Tua até porque entretanto surgiu a autorização para a construção de uma barragem que vai submergir parte da linha, independentemente da cota.
O representante da CP nesta viagem inaugural Bruno Martins disse nada saber sobre o assunto, nem tão pouco das obras feitas na Linha, competência da Refer, que não teve nenhum representante nesta viagem.
Garantiu ainda que as restrições da marcha à vista manter-se-ão "apenas até haver condições para retomar a circulação normal".
André Pires, do Movimento Cívico de Defesa da Linha do Tua propõe a recuperação de algum material para viagens turísticas nomeadamente das antigas automotoras conhecidas como Napolitanas.
A viagem entre Mirandela e o Tua demora agora duas horas, mais meia hora do que anteriormente, mas os utentes habituais não se importam.
Dos cinco passageiros que fizeram hoje a viagem das 10:00 quase todos saíram nas estações anteriores ao troço reaberto.
Maria Adelaide ia para Frechas depois de uma consulta médica em Mirandela.
Se não fosse o comboio tinha que passar toda a manhã na cidade a espera do autocarro.
Por estrada, o percurso e feito em cerca de uma hora mas para Luis Aniceto, a viagem de comboio e mais barata 4,90 euros entre Mirandela e o Tua.
Mesmo nestas condições, Pedro Couceiro, do Movimento de Afectados pelas Grandes Barragens e Transvases considera que a barragem projectada para a foz do Tua é "completamente incompatível com a linha".
Defende a manutenção da via férrea, como o casal Maria Adelaide e Justiliano Alberto, utentes que aguardavam na estação de Mirandela, embora para fazerem um percurso diferente.
"Agora deviam chegar era a Bragança", defendem, 20 anos depois de a linha ter sido desactivada entre Bragança e Mirandela.
O mesmo projecto tem o autarca de Mirandela e presidente do metro José Silvano para quem esta linha pode ser o único corredor ferroviário no país capaz de promover desenvolvimento turístico.
Silvano defende mesmo a ligação a Espanha e exorta os restantes autarcas a unirem-se neste projecto.
Os cerca de 20.000 turistas que anualmente viajam na linha do Tua para apreciar a paisagem são a grande aposta para o futuro e a CP reforçou os charters turísticos.
Para este fim, o comboio pode circular mesmo aos fins-de-semana e feriados, dias em que não há ligações comerciais.
"A linha já estava morta antes do acidente", afirmou o proprietário do café "Calça Curta", na estação do Tua, "se não melhorarem o serviço em termos de horários e coordenação com a Linha do Douro a sua reabertura não adianta muito".
RTP
Colaboração: Mário Carvalho

1 comentário:

AJS disse...

Já o disse aqui e noutros foruns, que a conciliação entre a linha e a barragem é possivel. Já ouvimos alguns membros do Governo dizer "que ainda nada está decidido". Outros dizem, que é possivel arranjar "transportes alternativos". Carlos Lage da CCDR, dá também a entender na sua entrevista ao Público que é possivel conciliar as duas opções. Pelo contrário vejo alguns defensores da linha dizer radicalmente que não. Ou linha, ou barragem. Quem é mais ditador? Penso que o bom senso deverá prevalecer e da discussão serena e responsável poderão sair boas soluções. A minha ideia é que para obter a máxima potência electrica é necessária a quota máxima, logo, parte da linha será submersa. Neste caso, porque não construir um cais no local onde acaba a linha e o resto do percurso até ao Tua, fazer-se de barco? Que chatice, dirão alguns! Mas, eu já fui várias vezes ao Barreiro e então? Vou de comboio até Sta Apolónia, certo? Depois, apanho um autocarro até ao Terreiro do Paço. Depois apanho o barco até ao Barreiro. E depois, ainda apanho outro autocarro até casa dos meus familiares! Não é uma "chatice"? Pergunto, os Transmontanos, ou melhor, os de Mirandela ficariam mais diminuidos se fizessem uma pequena viagem de barco até Foz Tua? Como diriam os da RR (Rádio Renascença), "vale a pena meditar nisto"!