A Lua, que há milhões e milhões de anos padecia ante a chama do Sol que persistia em ofuscava-la, durante metade de cada um desses triliões de dias, resolveu insurgir-se intentando controlar o seu movimento perpétuo, contra aquilo que lhe parecia ser obstinação.
Parou o seu tempo, encarou o seu oponente, e atacou. Em vão, pois o Sol, que não concebia a vontade da Lua em regelar o seu ardor há milhões e milhões de anos, durante metade de cada um desses triliões de dias, conseguiu elevar-se e com a sua luz encobri-la. Quotidianamente, cada um sofria a sua dor de não se impor, lutando contra o outro. O brilho do Sol foi-se preterindo, e a cor cinza brilhante da Lua persistia cada vez mais negra.
Esquecendo o que cada um tinha para dar, colidiram: a noite passou a ser dia, e o dia a ser noite. Nessa angústia, o Sol cada vez mais gelado, e a Lua cada vez mais quente, esgotaram as suas forças, e quase largaram de sentir o que outrora foram. Porquê me persegues, oh Sol, se eu quero dar o descanso de todas as horas aos Homens? Não vês, rodeado de toda essa tua luz, o meu caminho? A minha vontade de ser para todos? A minha vontade de ser? Não concebes que eu quero adormecer sempre perto daquela criança? Que eu quero descansar nesse espaço que ocupas? Porquê não posso eu, no meu esplendor, ser a lanterna de todos os dias a todas as noites? Não percebes que eu sou a luz dos olhos dos Homens? Sem mim, eles não vêem. Contigo, eu me emudeço e não cumpro o que sinto! Quero viver acordada e ver todos os dias aquela criança a brincar! E a criança, que já não sabia se dormir era agora ou brincar fora ontem, parou. A Lua e o Sol, esgotados num objectivo que cada um não abraçava, porque cada um tinha o seu tempo repleto no espaço da luta que calava, sem ouvir o que o outro sentia, e sem falar do que cada um gostaria que o outro lhe consentisse, olharam a mãe da menina, combinaram encontrar-se todos os dias e sentaram-se com ela, àquela mesma hora. Acordaram não se julgar, mas expressar o que cada um penava sempre à espera que o outro lesse a sua dor… E cada um falou de si, do que queria, do que não fazia, do que perdia, do que pensava que sentia que o outro sentia…
E a mãe da criança, que percebeu o que cada um carecia, ensinou-lhes a palavra de se dizerem como eram. E comunicaram, e entenderam o que cada um esperava que o outro cresse… e combinaram traçar dois trilhos contíguos. Encontraram uma senda onde ambos se cruzariam, todos os dias, para contar o que ficara para trás de cada criança, para que cada um pudesse continuar o dia dessa criança, cada um cumprindo o seu objectivo de ser feliz, rodeado de todas os ingénuos seres do Mundo nessa volta de 24 horas, sempre seguidas de mais 24 horas. E quando O Sol precisava brilhar durante mais tempo, no Verão, A Lua entendeu que necessita dormir mais, e iluminar a noite do outro lado do Mundo com o brilho cinzento da sua felicidade. Por vezes aconteceu a Lua sobrepor-se ao Sol, e escurecer o dia. Mas ao cruzarem-se, comunicavam a sua necessidade de voltar, e cada um, sorrindo o respeito do outro, voltava ao seu lugar.
Se defrontarmos o nosso objectivo no objectivo do outro, percorreremos o mesmo caminho, mesmo que em trilhos diferentes.
Alzira Lima de Jesus Castro Pinto
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