quinta-feira, 15 de maio de 2008

Daqui e dali... Vitorino Almeida Ventura

os Mandrágora e

a Crise da Linguagem


O meu gosto por deus sabe a gasolina.

Armando Silva Carvalho, em O amante japonês

No dia 9 de Maio, fui ao auditório da FEUP saber do projecto Mandrágora, num de quatro concertos integrados pela Câmara Municipal do Porto em seu próprio ‹‹Bairro a Bairro››. Embora isso se não re_

vestisse de interesse maior, mesmo se gratuito, tal primeiro concerto não alcançou tocar esse público-alvo de um em cada cinco habitantes da Cidade… Sá alguns melómanos do jazz ao heavy, passando (mas sempre ficando mais) pela folk. Esperemos que no dia 16 e 17 de Maio, respectivamente, nos auditórios da Pasteleira e de Campanhã, a tentativa de chegar a esse grupo mais desfavorecido seja, como na poesia da geração de 1970 (J. M. Magalhães, N. Júdice, F. Jorge. Franco A.), cujo principal objectivo era a ‹‹comunicabilidade››. A sua legibilidade, todavia,

foi seguindo incumprida senão de uma minoria. Como escreveu Pedro Mexia, digo, Rosa Maria Martelo: dada a Crise da Linguagem. Efectiva_

mente, é essa mesma Crise de uma Linguagem de recolha pura, tradicional, em nome dessa outra das Músicas do Mundo (que do festival de Sines chegaram à Bretanha e à Suécia, sendo estas influências nos Mandrágora dignas de estudo, assim como o jazz e a música clássica), fusão essa que produziu uma ‘Escarpa’, nome do 2º álbum do grupo portuense, algo difícil para o vulgo, que prefere subir nas escadas rolantes… Ou levar até ao Auditório, a bem dentro, o carro — _ amante japonês de Armando Silva Carvalho — autor revelado em livro nos anos de 1960, com A Lírica Consumível. Obra maior, contudo, para uma Escuta Musical de uma obra (quase tão-só) instrumental, a ‘Escarpa’ é

de um acto de amor entre culturas — ditas alta e baixa, incluindo nesta uma revisitação do popular beirão ‘O que calma vai caindo’.

Em palco, são os multi-instrumentistas: Filipa Santos — saxofone, gaita-de-foles e flauta; Pedro Viana — guitarra clássica; João Serrador — baixo; Sérgio Calisto — guitarra 12 cordas, violoncelo, nyquelarpa, moraharpa e bouzouki; Ricardo de Noronha — bateria e percussões…. Ricardo de Noronha, um baterista com uma visão plástica, lembrando a José João Cochofel (U Nu), mutatis mutandis. Depois,

esse pôr-do-sol que é a estética de Filipa Santos, com uma voz maravilhosa de uma alma inspirada, a descobrir no dueto com Francisco Silva (Old Jerusalem, que já incluí em algumas Offfffficinas de LEtras), o qual surge em colaboração, na excepção à regra instrumental. Também se movimenta bem o baixista João Ferrador, por contraste com a pose classicamente discreta de Sérgio Calisto. Mas fica-lhes bem. O elo mais fraco — posso dizer extra-musicalmente? —, é corporizado pelo ombro retorcido de Pedro Viana… Um bom músico, que deveria projectar-se na voz (se todos apresentam as canções em paridade), com uma outra dicção. Sempre abrindo

para lá do círculo dos músicos. Tudo pesado, é do melhor que se faz em Portugal. Aperfeiçoado ao máximo na boca de cena,

será, é certo, do melhor que se lavrará para (as Músicas d)o Mundo.


Vitorino Almeida Ventura

Post Scriptum: Há uma lenda medieval que dizia as raízes da Mandrágora deverem colher-se em noite de lua cheia, puxadas para fora da terra por uma corda presa a um cão preto. Se outro animal ou pessoa cumprisse esta tarefa, a raíz gritaria tão alto que o mataria! Outra lenda refere que a planta haveria por semente o sémen de de um enforcado…

1 comentário:

Anónimo disse...

Grande som, no my space. Obrigado VAV. Eles são mesmo bons.