terça-feira, 21 de agosto de 2007

Daqui e dali... Vitorino Almeida Ventura

Fernando Pessoa

queria ser reconhecido essencialmente na língua de Shakespeare (mais literalmente até, pois aí se expressou, pouco recorrendo ao inglês do século XX). Dos cinco livros de poemas que publicou em vida, quatro são de poesia inglesa. O poeta pura e simplesmente sobrevalorizou a qualidade desta. Por que é que, em vez de editar "Ephitalamium", não publicou, por exemplo, os poemas de Alberto Caeiro?

Como diria Freud, Pessoa investiu no objecto desejado quase-toda a sua líbido... Richard Zenith, no prefácio ao sexto e penúltimo volume da colecção "Obra Essencial de Fernando Pessoa", percorre detalhadamente as várias tentativas de Pessoa em se tornar um poeta inglês de facto e pleno direito. Enviou os seus folhetos a jornais britânicos e quis fazer sair em Inglaterra o livro The Mad Fiddler, que foi recusado mesmo quando o poeta se prontificou a arcar, ele-próprio, com as despesas de publicação.
‹‹Todas as tuas pulsões redundam em silêncio››, cantam os Xutos e Pontapés, que devem ter lido os Três Ensaios sobre a teoria da sexualidade...

No dito prefácio, correspondendo ao que a generalidade dos críticos considera, ou seja, não estar a poesia inglesa de Pessoa ao nível de Reis, Caeiro, Campos e do próprio ortónimo, Zenith chega a sugerir que a boa tradução de Luísa Freire (como já fora a de Jorge de Sena) poderia dobrar o prazer do leitor relativamente ao original. Metade do prazer, portanto... Que

Pessoa não percebeu que o que escrevera em português lhe permitiria conquistar — e, num lugar infinitamente mais alto, _ seu objecto!

vitorino almeida ventura

1 comentário:

Anónimo disse...

Amigo Vitorino,

O que seremos nós, (e)videntes humanos:??
O agora?
Já fomos?
Voltamos?
Conquistamos e recomeçamos?
Elementar…apenas que estamos.
Líbido? Amadurecimento através da troca de nosso objecto/objectivo…?

Quantos dentro de cada?
Quantos «Fernando Pessoa»?
Quantos «Freud»?

Quantas «Vitorino» em cada frase, palavra ou gesto…
Quantas «Alzira»????? Nem sequer congemino!

De facto, (dúvida:)
Fernando Pessoa
não tinha um «EU» definido…e por isso criava outras personagens?
Ou, simplesmente,
sabia cada um dos seus «EU», assumindo-o no tempo certo,

Capacidade que nos escapa?,
quando diz:

«Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem achei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,

Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem,
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.

Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que segue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo: 'Fui eu?'
Deus sabe, porque o escreveu.»
(Fernando Pessoa)

E assino quando diz:
«Pessoa não percebeu que o que escrevera em português lhe permitiria conquistar — e, num lugar infinitamente mais alto, _ seu objecto!»

Alzira Lima de Jesus Castro Pinto