terça-feira, 30 de outubro de 2007

Daqui e dali... Vitorino Almeida Ventura

Jacques Ranciére e a força da arte
nos filmes de Pedro Costa


Sobre a série de Vanda e de Ventura, nos filmes de Pedro Costa, o filósofo Jacques Ranciére foi tocado por uma maneira de representar a trajectória de pessoas a que chamamos marginais como uma realidade estética. Estética não no sentido de bela, mas em que aquilo que está em questão a cada momento é o poder da palavra e do gesto num lugar.
Em "Juventude em Marcha" de Pedro Costa agrada-lhe essa capacidade épica confiada aos personagens. O facto de Ventura não ser um imigrante infeliz, doente da cabeça, desempregado, que exibe o seu sofrimento, mas, ao contrário, uma espécie de senhor de um reino longínquo, que impõe absolutamente a sua pessoa e a sua palavra, bem como o seu silêncio.
Mais diz que o cineasta não dá explicações sobre as razões sociais que fazem com que existam tais bairros nem sobre o realojamento dessas pessoas. É necessário ignorar toda essa longa cadeia de razões, para dar a um lugar, a uma personagem, a uma palavra, a um gesto, a sua potência sensível. Para fazer ouvir uma palavra que nunca é escutada, fica necessário instaurar um dispositivo estético de distância. Não as ouvimos enquanto forem tomadas sob a forma de reportagem: um pobre que fala pobre, um emigrante que fala emigrante... Apenas fazendo reconhecer a sua condição. A força da arte é, precisamente, a de sair das figuras, das formas sensíveis esperadas, para lhes dar um modo outro de presença. Isso supõe essa distância. Diante de um ecrã, não estamos perante uma pessoa, mas na posição de espectador. O que temos diante de nós não é um indivíduo que conta a sua vida, mas uma figura estética que impõe a sua potência.

vitorino almeida ventura, citando Jacques Ranciére

Post Scriptum: Em Carrazeda, o fotógrafo Leonel Castro captou o silêncio do Bairro do Iraque e dos seus senhores... Para quando uma exposição?

4 comentários:

Anónimo disse...

Se bem entendo, o que é preciso é sentir o peso dos problemas, não a comiseração perante um indivíduo; fazer pensar observando um caso tipo. Será isto outra espécie de neorealismo ou um anti- neorealismo? Ou será arte tout-court?
Estou a tentar entendê-lo, não me leve a mal a ignorância.

vitorino almeida ventura disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
vitorino almeida ventura disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
vitorino almeida ventura disse...

Entendeu muito bem a Jacques Ranciére - e a Pedro Costa, um dos maiores cineastas portugueses. Já viu a Juventude em Marcha? E o filme Ossos?

Bom Cinema! Muito bom cinema!

vitorino almeida ventura