terça-feira, 26 de junho de 2007

Daqui e dali... Mário Abreu Lima

OCM - Impacto no Douro

Retomando o tema abordado no artigo anterior, pretendo hoje comentar os impactos decorrentes da aplicação da OCM Vinhos, tal como a conhecemos, na Região do Douro, região com especificidades muito próprias que a distinguem de qualquer outra região demarcada do país e do Mundo. Desde logo por ser a única que, dentro do mesmo espaço, pode produzir duas denominações de origem das mais conceituadas do Mundo. Isto gera tensões várias e alguns desequilíbrios, que impõem uma difícil e complexa organização e uma competente e actuante estrutura de gestão e controlo. Num território de orografia muito difícil - o que eleva enormemente os custos de produção - a viticultura sustenta-se numa estrutura fundiária desequilibrada e economicamente dependente da produção do vinho do Porto. Ora, tendo em conta esta realidade, que todos sentimos e vamos vivendo, como enquadrar na região as propostas da senhora comissária Fischer Boel?
- É proposto que sejam suprimidas todas as medidas de gestão do mercado, com especial destaque para o desaparecimento das ajudas à destilação voluntária para a produção do "álcool de boca"!
Terá sido sopesado o impacto que esta medida terá no custo de produção do vinho do Porto e as consequências na sua competitividade, com o previsível agravamento do preço, calculado em cerca de 12%? Ter-se-á avaliado a consequente possibilidade de quebra do preço do vinho de mesa à produção - estimável em cerca de 20% a 30% - bem como o agravamento dos excedentes regionais e comunitários por se poder tornar mais vantajoso adquirir o álcool em países terceiros, deixando que o mercado livre mundial faça os ajustamentos impostos pela lei da oferta e da procura?
- Pretende-se implantar uma medida de arranque de 200 mil hectares até 2013, sendo o valor proposto como prémio de arranque inferior a um terço do valor de mercado dos direitos no Douro!
Ainda a Europa não conhecia boa parte das suas actuais fronteiras e já no Douro existia o condicionamento da plantação da vinha. Com esta medida, acabará a senhora comissária com o nosso valor acrescentado e a nossa reputação, alcançados e construídos por sucessivas gerações de viticultores e comerciantes.
- Defende-se igualmente a liberalização dos direitos de plantação a partir de 2014.
Para além da desvalorização do património dos viticultores (que se estima em cerca de 600 milhões de euros) será destruído o já débil equilíbrio do mercado de vinhos na região. Parece que a senhora comissária não está atenta ao que se passa, por exemplo, na Austrália, onde a total desregulamentação criou enormes excedentes, provocando acentuada quebra dos preços.
Com estas propostas de reforma, a viticultura no Douro não vai desaparecer, mas será seguramente muito diferente, quer no que respeita aos viticultores, quer à ocupação do território, e, consequentemente, à paisagem, que constituiu a nossa mais-valia em termos de procura turística.
Mas não é só isto que nos deverá preocupar. Também no que concerne às denominações de origem, vemos com preocupação alguma displicência por parte da Comissão na sua defesa e afirmação.


A DO Porto e também já a DO Douro, para além de marcas consagradas, são direitos de propriedade industrial, que beneficiam de grande projecção e prestígio internacional e que necessitam de um sistema de registo com elevado nível de protecção, sistema esse que os defenda de usurpações e imitações em produtos ou serviços idênticos, bem como dos aproveitamentos indevidos do seu prestígio em prol de outros quaisquer produtos.
Deveremos, por isso, reclamar protecção para estas DO, não só pela sua natureza colectiva e pelos interesses públicos que tutelam, como também pelo que já se encontra consagrado no acordo de TRIP, concluído no quadro da Organização Mundial do Comércio, no domínio da defesa das marcas comerciais e dos direitos de autor.
Resta-nos ainda acreditar que com a força das nossas críticas e os sustentados argumentos, venhamos a contribuir para fortalecer esta proposta de reforma da OCM, nela afirmando o que nos diferencia e nos tem valorizado no decurso dos tempos.
Mário Abreu Lima in JN

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