sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Daqui e dali... Movimento Cívico Pela Linha do Tua

«Pena que os da terra não conheçam a sua terra como os de fora...............»

cito: Os vales, quanto mais profundos e estreitos mais impressionantes para o Homem e belos para fotografar, mas também mais vulneráveis (apetecíveis) a ser emparedados e submersos por barragens. O rio Tua, a 100m sobre o nível do mar, é ladeado por escarpas que chegam aos 676m e pouco menos ao longo de quilómetros. O rio Tinhela, seu afluente, também a submergir, contorna uma extensa vertente selvagem com 500m de altura. Os blocos de granito das Fragas Más no Tua têm centenas de metros de diâmetro. Estar nestes ambientes magníficos proporciona-nos uma experiência única da Terra.

O que a barragem põe em causa:
PAISAGEM:
20Km de vale encaixado, de aspecto agreste, da Brunheda à Foz do Tua, e ainda o Rio Tinhela e a Ribeira de Barrabáz. A diferença altitude é tão extrema que em Foz-Tua pode estar enublado, aos 300m entramos num nevoeiro denso com 5m de visibilidade, aos 650m saimos das nuvens que se vêem agora por cima iluminadas pelo sol, cobrindo vales e ladeadas de mais cumes.
FLORA: O Tua é um dos poucos locais onde se pode ver o aspecto que Portugal tinha na pré-história, em termos de cobertura vegetal. O difícil acesso, pela inclinação, extensão e esforço físico, impediu a agricultura em muitos locais, permanecendo a flora selvagem, principalmente os zimbros, arbustos de grande porte, quase arbóreo. O ar limpo dada a pouca indústria local e a ausência de pessoas permite a muitas espécies de líquenes crescerem luxuriantemente. Castanheiros, pinheiros (de alepo?), e sobreiros cobrem as vertentes sobranceiras ao rio Tua numa floresta densa e verdejante dada a ausência de incêndios. Eucaliptos são praticamente inexistentes.
FAUNA: Nos túneis do comboio há populações de morcegos. Vê-se o esquilo, muitas espécies de aves incomuns, e ouve-se o pica-pau. Dizem-me existir águia real, bufo real, cegonha preta, e talvez falcão peregrino e abutres, e que várias espécies e sub-espécies de borboletas e libélulas em Portugal só podem ser encontradas no Tua. *Se me pode, ou conhece quem possa, ajudar a identificar uma libelinha ou efemeróptero muito invulgar que lá encontrei, diga-me por favor e enviar-lhe-ei uma foto.*
GEOLOGIA: As termas de S. Lourenço, com água quente sulfurosa brotando dos pés da estátua medieval do mesmo santo, onde se tomam banhos medicinais, num edifício de forma medieval e invulgar, e as Caldas de Carlão, estas já com instalações modernas de hidroterapia, são algumas das manifestações do vulcanismo da região. Tudo isso, mais a praia fluvial no Tinhela nas Caldas de Carlão, com arvoredo que lembra o Choupal em Coimbra, são para submergir. Bem perto, os algares no Rio Tinhela, também. As interessantes formas de erosão da rocha pela água no rio Tua (foto anexa), também desaparecerão, mesmo que se construíssem mini-hídricas em vez da barragem de 130m de altura. As cascatas da Ribeira de S. Mamede, caindo por fim sobre o Tua, também serão submersas.
HISTÓRIA: A linha do Tua, concluída em 1880, cuja construção na rocha escarpada deve ter equivalido em dificuldade à construção da Ponte 25 de Abril, é considerada por muitos o principal motivo porque a barragem não deve ser construída, porque será submersa ainda para montante da Brunheda (a nova bacia prevista é para ter uma extensão de 3822Km2). Seria um insulto aos que a construíram em condições inimagináveis e à nossa memória colectiva destruir esta relíquia de Arqueologia Industrial portuguesa, com as suas pontes de ferro e toda a parafernália de equipamentos ainda existentes, incluindo as estações e o comboio a vapôr que agora leva turistas da Foz-Tua à Régua. 150 anos ao serviço, interrompidos pelo acidente de 12 de Fevereiro último, apesar da boa manutenção e considerável afluência de utentes.
ANTROPOLOGIA: A agricultura de socalcos (oliveira, etc) que mesmo assim ainda é feita, chegando nalguns pontos quase até ao rio por caminhos estreitos em ziguezague, tem maior biodiversidade que nalgumas zonas da Ásia classificadas como Património da Humanidade. A água chegaria a menos de 10m da aldeia do Amieiro, descaracterizando por completo aquele lugar e inundando hortas ainda em actividade.
SEGURANÇA: A população de Foz-Tua viveria à boca da barragem, que pode ruir por terramoto, erro técnico, deficiência nos materiais, queda de pedras como as que descarrilaram o comboio em Fevereiro, sabotagem ou terrorismo; as 2 pontes (rodoviária e ferroviária) actualmente aí existentes seriam provavelmente varridas pela água, impossibilitando até os socorros necessários.
TURISMO: Considerado a principal saída para o desenvolvimento da região, imensos projectos turísticos em marcha seriam inviabilizados.
Desde logo a constituição dum parque de natureza do Baixo-Tua, da Brunheda à Foz do Tua, e englobando o Baixo-Tinhela desde Martim, e a Ribeira de Barrabáz, privado ou público. Aqui poderiam ser realizadas actividades modernas de vária ordem, didácticas, escalada, cicloturismo, passeios pedestres, talassoterapia, ..., incluindo os passeios fotográfico-científicos que eu e o Visionarium de Sta. Maria da Feira tencionávamos oferecer. O comboio a carvão poderia andar de novo na linha do Tua, levando turistas em visitas guiadas aos muitos motivos de interesse. Os acessos à linha poderiam ser melhorados, infraestruturas de apoio criadas, trilhos bem assinalados à maneira suíça; um potencial ainda largamente por explorar num país com forte aptidão turística. Já hoje se oferecem visitas guiadas, por antigas estradas romanas adjacentes. Em Foz Tua existem bons restaurantes, a Casa do Tua é um hotel de qualidade e há ofertas de turismo rural em locais próximos. Em Carlão, as casas surgem entre enormes blocos de granito. A própria paisagem de S. João da Pesqueira a Pinhão, onde se atravessa o Douro e onde está prevista outra barragem, e daqui a Favaios, é incrivelmente tridimensional e bela, com as vinhas e os ciprestes a lembrarem a Toscânia, na Itália, onde se fazem workshops internacionais de Fotografia.
Os rios devem continuar a ser rios e as montanhas a ser montanhas. As barragens e as pedreiras nivelam o mundo, que fica assim mais desinteressante. Tendo em conta o que já causámos ao planeta, há que evitar mais danos. As barragens podem ser vistas como uma forma de obter energia renovável, mas quebram o fluxo natural de sedimentos das montanhas para o mar, e as praias já começam a não ter areia (só este ano, aconteceu na Costa da Caparica, Ericeira, Póvoa do Varzim?). São apresentadas como um instrumento para mitigar as alterações climáticas reduzindo as emissões de CO2 para a atmosfera pelos mesmos políticos que não escondem o seu regozijo com a descoberta de novos poços de petróleo no Brasil e prospecções em Peniche, nada fazem para nos pôr a andar a álcool e não querem painéis fotovoltaicos porque sai caro, em Lisboa querem-nos a andar de transportes públicos e no Tua acabam com o comboio, levando à conclusão que o problema deles é realmente o preço a que está o petróleo. Nós a recear o degelo dos pólos e já a ser inundados por dentro... No site do ICNB, lê-se: "O Comissário Europeu para o Ambiente, Stavros Dimas, considerou ainda que a perda de biodiversidade é mais problemática do que as alterações climáticas"
No Parque Nacional de Yosemite, California, USA, quando lá estive, e apesar da seca que decorria, estavam a planear desmontar uma barragem para recuperar a zona para ficar como o vale central que atraía nessa altura já 1 milhão de eco-turistas/ano (6 dólares por dia cada entrada).
Portugal, em ideias, anda 50 anos atrasado.

José Romão
Licenciado em Biologia pela Universidade de Coimbra
Mestre em Ciências Biológicas pela Wayne State University, Michigan, EUA
Doutorado em Genética pela Purdue University, Indiana, EUA
Fotógrafo de Natureza
http://www.milcores.pt/

4 comentários:

Anónimo disse...

Está a ser-me muito difícil tomar posição sobre este assunto.Por um lado, acho que é preciso criar energias alternativas ao petróleo mas por outro tenho um certo apreço pela preservação da natureza. A minha postura é, em princípio, a conciliação, na medida do possível. Fazer, em regra, atrai-me mais que o não fazer até pelos empregos que proporciona. Noutro sentido, o não fazer significa, muitas vezes, imobilismo, que tem um pouco o sentido de cruzar os braços. Quando alguém toma uma iniciativa apetece-me quase sempre dizer que sim: - faça-se.

Anónimo disse...

Está a ser-me muito difícil tomar posição sobre este assunto.Por um lado, acho que é preciso criar energias alternativas ao petróleo mas por outro tenho um certo apreço pela preservação da natureza. A minha postura é, em princípio, a conciliação, na medida do possível. Fazer, em regra, atrai-me mais que o não fazer até pelos empregos que proporciona. Noutro sentido, o não fazer significa, muitas vezes, imobilismo, que tem um pouco o sentido de cruzar os braços. Quando alguém toma uma iniciativa apetece-me quase sempre dizer que sim: - faça-se.

mc disse...

os mesmos que são apologistas das energias alternativas ao petróleo
regozijaram-se com a descoberta do 2º maior futuro poço do mundo!! as acções da Galp subiram quasi 50% em 2 dias.. vão fechar o poço para não poluir?... Vão baixar o preço em Portugal... Segundo o Presidente da Galp ENG oliveira não podem baixar mesmo quando estiver em exploração porque o preço é definido na Holanda...

Os mesmos que ganham dinheiro a poluir querem ganhar com as chamadas energias alternativas que nada têm de limpo,,... enfim estórias de marketing .. até vendem frigoricos no polo norte e casacos de peles no tórrido Equador... e trás os montes é como a Nigéria e o Estado Central como as petroliferas.. levam tudo ..e só deixam lixo

Anónimo disse...

Não há incêndios nas encostas do Tua.- diz o autor do artigo.
Eu, JLM, já nos anos de 66,67,68,69,70, pelos 20 de Junho,provocados pelo comboio a carvão, vi muitos incêndios, e até parcipei no seu combate,nas ENCOSTAS DO TUA.