O Museu do Douro vai lançar, no próximo dia 26, um livro em que serão perpetuados no tempo 250 lendas e 166 contos populares que estavam em risco de extinção. Património recolhido ao longo de três anos em Tabuaço, Carrazeda de Ansiães e Vila Flor.
Flora Teixeira, de 80 anos, e Florinda Lopes, de 79, vivem em Pombal de Ansiães, concelho de Carrazeda, e são duas das protagonistas da obra "Património imaterial do Douro - Narrações orais", cuja coordenação científica foi do investigador Alexandre Parafita.
Sentadas a desfrutar o que resta de uma plácida tarde de Outono, ambas recordam que "a falta de televisão e de rádio" era uma das causas para que nos serões de antigamente medrasse a quantidade de lendas, contos e lengalengas. Património imaterial que passava de geração em geração. "Avô, conte-nos lá uma história!", lembra-se Flora, que na sua meninice encontrava nele fonte de distracção. Já avó, foi ela que as contou às netas.
Reza uma das histórias guardadas na memória por Flora que "vivia no Pombal um homem que tinha o fado de sair de casa à meia-noite e que se transformava em cavalo. Tinha de percorrer sete freguesias onde existisse pia baptismal. Um dia, a mulher dele pediu a um vizinho que, quando o visse passar, o picasse com um aguilhão. E assim aconteceu junto à casa, que ainda existe. Ele transformou--se em homem e disse: "boa-noite, senhor José Pereira". Este ficou tão assustado que até adoeceu".
"Essa história é do tempo do meu bisavô e as minhas tias sempre disseram que foi verdade", acrescenta Florinda, lembrando uma outra: "A minha bisavó era a mulher do bisavô da Flora. Numa noite, ele foi para a quinta tratar do vinho nos tonéis e, quando regressava a casa, viu um cabrito aos saltos. Lá o agarrou, pô-lo ao pescoço e subiu até à aldeia. Uma vez chegado, o cabrito deu um pulo, riu-se e disse-lhe: "agora, vai gabar-te que vieste todo o caminho com o diabo às costas"", sorri, sublinhando que "há muitas mais lendas como esta".
Ambas valorizam a recolha feita por Alexandre Parafita, porque não vêem nos jovens garante de preservação daquelas lendas e afins. "Andam entretidos com coisas novas, como a Internet e discotecas", atira Flora. O autor prefere justificar o total desapego com a "quebra do convívio intergeracional", ainda que "muitas das crenças tendam a esbater-se por força da evolução do conhecimento e da ciência".
E mesmo sendo "saudável", nota que "menosprezar a memória dessas crenças ou desrespeitar as tradições dos povos é um indicador de penosa ignorância ou malformação das novas gerações". Eduardo Pinto, DN
Flora Teixeira, de 80 anos, e Florinda Lopes, de 79, vivem em Pombal de Ansiães, concelho de Carrazeda, e são duas das protagonistas da obra "Património imaterial do Douro - Narrações orais", cuja coordenação científica foi do investigador Alexandre Parafita.
Sentadas a desfrutar o que resta de uma plácida tarde de Outono, ambas recordam que "a falta de televisão e de rádio" era uma das causas para que nos serões de antigamente medrasse a quantidade de lendas, contos e lengalengas. Património imaterial que passava de geração em geração. "Avô, conte-nos lá uma história!", lembra-se Flora, que na sua meninice encontrava nele fonte de distracção. Já avó, foi ela que as contou às netas.
Reza uma das histórias guardadas na memória por Flora que "vivia no Pombal um homem que tinha o fado de sair de casa à meia-noite e que se transformava em cavalo. Tinha de percorrer sete freguesias onde existisse pia baptismal. Um dia, a mulher dele pediu a um vizinho que, quando o visse passar, o picasse com um aguilhão. E assim aconteceu junto à casa, que ainda existe. Ele transformou--se em homem e disse: "boa-noite, senhor José Pereira". Este ficou tão assustado que até adoeceu".
"Essa história é do tempo do meu bisavô e as minhas tias sempre disseram que foi verdade", acrescenta Florinda, lembrando uma outra: "A minha bisavó era a mulher do bisavô da Flora. Numa noite, ele foi para a quinta tratar do vinho nos tonéis e, quando regressava a casa, viu um cabrito aos saltos. Lá o agarrou, pô-lo ao pescoço e subiu até à aldeia. Uma vez chegado, o cabrito deu um pulo, riu-se e disse-lhe: "agora, vai gabar-te que vieste todo o caminho com o diabo às costas"", sorri, sublinhando que "há muitas mais lendas como esta".
Ambas valorizam a recolha feita por Alexandre Parafita, porque não vêem nos jovens garante de preservação daquelas lendas e afins. "Andam entretidos com coisas novas, como a Internet e discotecas", atira Flora. O autor prefere justificar o total desapego com a "quebra do convívio intergeracional", ainda que "muitas das crenças tendam a esbater-se por força da evolução do conhecimento e da ciência".
E mesmo sendo "saudável", nota que "menosprezar a memória dessas crenças ou desrespeitar as tradições dos povos é um indicador de penosa ignorância ou malformação das novas gerações". Eduardo Pinto, DN
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