Apesar de abundarem os livros de “Civilidade e Etiqueta”, não se pode dizer, em boa verdade, que a cortesia, a correção, a polidez, a delicadeza ou, melhor, a educação coletiva esteja em grau elevado nos nossos tempos.
Crise de moral, destrambelhamento dos nervos pelas dificuldades da vida presente? Não sei; talvez uma e outra coisa.
O que sei é que as expressões de cortesia estão a rarear, não por culpa do idioma, que nelas é fértil, mas por culpa dos falantes.
“A inducação é muito linda”, dirá alguém menos alfabetizado…
“Educação”, “educado” são palavras que, embora assim adulteradas, mostram, no entanto, que até o homem de rudes maneiras avalia ou aceita como alta virtude a alimentação do espírito nos princípios sãos da moral.
Sim, porque educatio vem de “educo”, cujo sentido é - alimentar, cuidar de.
Os Latinos à educação, à polidez, à cortesia chamavam-lhe “humanitas” (humanidade), querendo dizer que o correto procede como um homem deve proceder, e não como um bruto.
Também nós cá, em Portugal, noutros tempos chamávamos vilão ao da vila, rústico, e daí - grosseiro, etc.
E cortês, cortesia vem da velha ideia de serem os da corte, ou dela frequentadora, pessoas de boas maneiras.
Eu não discuto agora a alta questão do desnível entre a “delicadeza” da cidade e a “rudeza” do campo.
Mas sempre direi que na gente aldeã tenho encontrado muita criatura útil à civilização citadina.
Tudo o que neste mundo se usa está sujeito ao gasto. Ora, as expressões de cortesia, como tantas outras, caem muita vez no mecanismo de frases-feitas, de verdadeiros estribilhos sem realidade de significação.
Mas isto é universal!
Vem todo este arrazoado a propósito do recente (e triste) espetáculo que nos foi oferecido (em direto) na Assembleia da República aquando da discussão do Orçamento para 2011.
Quando algum analfabeto deixa fugir, na fluência oral, deturpações como “fazerei”, “menza”, etc., são desvios fonéticos e morfológicos explicáveis; quando alguém diz “a gente vamos” em defensível sintaxe, criticada, todavia, pelos gramáticos feros; quando alguém profere deturpadamente “tisoira” por tesoura; quando se nota um desmando qualquer à linguagem tida por modelar, as chamadas pessoas cultas (como os deputados o deverão ser), deveriam reagir, criticando e, às vezes, até parodiando os pecadores venais. Mas é assim? Claro que não!
Quando no “salão” mais nobre do nosso país, os “dignos” representantes de um povo se permitem usar da linguagem mais baixa, mais torpe, mais inquinada - “calças na mão” é só um exemplo (não contando “palhaço” e “burro”) - então como querer que o País os aceite?
Se os que erram por compreensível ignorância recebem crítica, também os que erram por desleixo, por teimosia ou por falsa cultura merecem o azorrague da crítica; merecem vir ao pelourinho espiar as culpas do desrespeito ao civismo, à educação.
A expressão política continua uma lástima. O erro campeia, ou antes, corre infrene pelos campos da expressão.
Os vícios da expressão, pela sua ubiquidade, são tão inabarcáveis que um homem só não dispõe de tempo nem de nervos para os considerar.
É possível que as minhas palavras desagradem aos apologistas do erro e aos preguiçosos da cultura portuguesa que supõem não ser preciso pôr cobro energicamente à viciação da linguagem pública.
No entanto, e apesar de provado até à náusea a falta de “cultura”, a pretensa “civilidade”, a pouca “cortesia” da nossa classe política… temos de viver com o que temos!
Mas choca-me que um “líder” parlamentar, desrespeitosamente se dirija a um seu par com: “os senhores foram apanhados com as calças na mão!”.
É quase inacreditável! É, no mínimo, deselegante… a nossa democracia não o merece, como o não merece o Povo que neles votou!
No fim destas considerações não fique a julgar-se que elas sejam qualquer apologia de palavrinhas doces, muito impostoramente gentis. O intento deste escrito é o convite sincero para se reparar na alma das palavras que, de tanto se empregarem, já pouco significam ou já raramente se usam, o que é pena, pois com elas, se formos sinceros, poderemos tornar os encontros da fera humana muito menos incómoda.
Carlos Fiúza
Crise de moral, destrambelhamento dos nervos pelas dificuldades da vida presente? Não sei; talvez uma e outra coisa.
O que sei é que as expressões de cortesia estão a rarear, não por culpa do idioma, que nelas é fértil, mas por culpa dos falantes.
“A inducação é muito linda”, dirá alguém menos alfabetizado…
“Educação”, “educado” são palavras que, embora assim adulteradas, mostram, no entanto, que até o homem de rudes maneiras avalia ou aceita como alta virtude a alimentação do espírito nos princípios sãos da moral.
Sim, porque educatio vem de “educo”, cujo sentido é - alimentar, cuidar de.
Os Latinos à educação, à polidez, à cortesia chamavam-lhe “humanitas” (humanidade), querendo dizer que o correto procede como um homem deve proceder, e não como um bruto.
Também nós cá, em Portugal, noutros tempos chamávamos vilão ao da vila, rústico, e daí - grosseiro, etc.
E cortês, cortesia vem da velha ideia de serem os da corte, ou dela frequentadora, pessoas de boas maneiras.
Eu não discuto agora a alta questão do desnível entre a “delicadeza” da cidade e a “rudeza” do campo.
Mas sempre direi que na gente aldeã tenho encontrado muita criatura útil à civilização citadina.
Tudo o que neste mundo se usa está sujeito ao gasto. Ora, as expressões de cortesia, como tantas outras, caem muita vez no mecanismo de frases-feitas, de verdadeiros estribilhos sem realidade de significação.
Mas isto é universal!
Vem todo este arrazoado a propósito do recente (e triste) espetáculo que nos foi oferecido (em direto) na Assembleia da República aquando da discussão do Orçamento para 2011.
Quando algum analfabeto deixa fugir, na fluência oral, deturpações como “fazerei”, “menza”, etc., são desvios fonéticos e morfológicos explicáveis; quando alguém diz “a gente vamos” em defensível sintaxe, criticada, todavia, pelos gramáticos feros; quando alguém profere deturpadamente “tisoira” por tesoura; quando se nota um desmando qualquer à linguagem tida por modelar, as chamadas pessoas cultas (como os deputados o deverão ser), deveriam reagir, criticando e, às vezes, até parodiando os pecadores venais. Mas é assim? Claro que não!
Quando no “salão” mais nobre do nosso país, os “dignos” representantes de um povo se permitem usar da linguagem mais baixa, mais torpe, mais inquinada - “calças na mão” é só um exemplo (não contando “palhaço” e “burro”) - então como querer que o País os aceite?
Se os que erram por compreensível ignorância recebem crítica, também os que erram por desleixo, por teimosia ou por falsa cultura merecem o azorrague da crítica; merecem vir ao pelourinho espiar as culpas do desrespeito ao civismo, à educação.
A expressão política continua uma lástima. O erro campeia, ou antes, corre infrene pelos campos da expressão.
Os vícios da expressão, pela sua ubiquidade, são tão inabarcáveis que um homem só não dispõe de tempo nem de nervos para os considerar.
É possível que as minhas palavras desagradem aos apologistas do erro e aos preguiçosos da cultura portuguesa que supõem não ser preciso pôr cobro energicamente à viciação da linguagem pública.
No entanto, e apesar de provado até à náusea a falta de “cultura”, a pretensa “civilidade”, a pouca “cortesia” da nossa classe política… temos de viver com o que temos!
Mas choca-me que um “líder” parlamentar, desrespeitosamente se dirija a um seu par com: “os senhores foram apanhados com as calças na mão!”.
É quase inacreditável! É, no mínimo, deselegante… a nossa democracia não o merece, como o não merece o Povo que neles votou!
No fim destas considerações não fique a julgar-se que elas sejam qualquer apologia de palavrinhas doces, muito impostoramente gentis. O intento deste escrito é o convite sincero para se reparar na alma das palavras que, de tanto se empregarem, já pouco significam ou já raramente se usam, o que é pena, pois com elas, se formos sinceros, poderemos tornar os encontros da fera humana muito menos incómoda.
Carlos Fiúza
1 comentário:
Cortesia, civilidade e etiqueta
foi o que faltou em carrazeda durante muitos anos. Ainda hoje o pagamos.
Ass. Álvaro Moura
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