segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Daqui e dali... Vitorino Almeida Ventura

A Senhora Ministra, os professores e os cafés

‹‹Não sei se o que vou dizer serve para alguma coisa, porque tenho a clara consciência de que me estou a dirigir a uma massa de idiotas com o cérebro liquefeito e sei que não vão perceber absolutamente nada.
Agrada-vos este início? Trata-se de um caso de
captatio
malevolentiae, uma figura de retórica que não existe e que não pode existir, cujo objectivo é inimizar a audiência e virá-la contra o orador.››
Umberto Eco, in A Passo de Caranguejo

A Senhora Ministra, efectivamente, usou e abusou de tal figura para com os professores. Villaverde Cabral referiu que a Senhora é populista com os pais, liberal com os alunos e demagógica para com os professores. Deixem-me traduzir por miúdos:

Populista com os pais porque afirmou que os professores são os únicos responsáveis pelo insucesso dos alunos. Estes entenderam, então perante isto, que os professores (pelos exemplos que conheciam dos cafés) só querem boa vida, recebem muito (não sabendo que os do topo e
os reformados recebem mais do dobro de quem está no início da carreira) e não querem ser avaliados. O que os pais não sabem é que o modelo da Senhora Ministra é baseado na (sua, suponho) experiência de passagem pelos cafés-restaurantes. Assim,

para que todos os outros professores os pudessem virtualmente frequentar, em vez de prepararem aulas e investigarem, fez com que todos os professores tivessem n reuniões para ler o jornal (digo: legislação), preencherem os impressos de euromilhões (digo: grelhas e grelhas), tomando o pequeno almoço, o almoço, o lanche e o jantar na Escola. Assim, todos frequentam os cafés virtuais. Daí que a blogosfera aumentasse imenso! Desidério Murcho referiu que a senhora
Ministra retirou o tempo de preparação de aulas aos professores competentes — e os pais estão contentes porque os têm mais tempo nas Escolas (em reuniões intermináveis) e os incompetentes (nas mesmas reuniões) já não andam agora pelos cafés, como os arrumadores pelas ruas.

Liberal com os alunos, porque no final do ano, como referiram Nuno Crato e Medina Carreira, os seus educandos haverão exames o mais simples possível, com matéria do 9º ano para os do 12º e do 6º para os do 9º. E todos pensarão que tal se deve ao esforço do Ministério em avaliar os professores!

Demagógica com os professores, porque diz (agorinha mesmo) que o seu modelo vai em simplex. E neste simplex, põe de fora a componente científico-pedagógica, para quem não quiser nela ser avaliado. Isto quer dizer que o modo como se dá aulas e se o professor sabe ou não as matérias cientificamente, pode ser posto de lado. — E ainda pensam os pais, quando vão ao café e não vêem lá os professores, que o Ensino dos seus filhos está a melhorar!

Vitorino Almeida Ventura

2 comentários:

Unknown disse...

As suas ideias sobre a ministra são de respeitar,até porque não me sinto capaz de fazer um juizo correcto sobre ela e a sua actuação.No entanto,confesso-lhe que não gosto de ver as suas apreciações demasiado centradas numa pessoa,embora seja a primeira responsável pela política educativa,que ,esta sim, pode ser livremente combatida.
JLM

vitorino almeida ventura disse...

Caro JLM:

Como percebeu bem onde eu queria chegar! — ao populismo dos que diziam que os professores não faziam nada, a não ser metaforicamente frequentar os cafés (sem pôr em causa a pequena parte que os frequentam, preparando as aulas sob uma taça ou duas...), ou seja: a S.ra Ministra e o seu eco. Mas há também maus pais, que não acompanham a Educação dos filhos, e maus alunos, que não querem saber nada de nada, não há só maus professores.

Do outro lado, tem razão — para mim, não estão os sindicatos, mas pessoas como Nuno Crato ou Manuel Villaverde Cabral ou Matias Alves ou Ana Benavente. Ou até José Manuel Fernandes ou Nuno Pacheco, do Público (ao início mais pró-Governo e agora mais pró-luta dos professores) pois perceberam a demagogia dos exames — que as notas melhoraram devido ao facilitismo de quem os fez. E pelo facto de Nuno Crato, Presidente da Sociedade Portuguesa de Matemática, ter chamado a atenção para o facto, tendo sido vexado pela Ministra e pelos Secretários de Estado, como já antes e depois a directora da DREN para com o pensador Matias Alves sobre a complexidade e inaplicabilidade labiríntica deste processo de avaliação, dizendo que já o vira escrever mal em outros sítios.

Numa próxima, voltaremos às políticas.

Só por um dia, deixe-me agora ser um bocadinho panfletário. De uma forma mediática, em sound bite:

NÃO A ESTE MODELO DE AVALIAÇÃO IMPORTADO DO CHILE, PARA CONTROLAR AS MASSAS!

BEBAMOS O SABER, NUM MODELO DE UM PAÍS EUROPEU, MAIS AVANÇADO EM CONHECIMENTO!

Vitorino Almeida Ventura