Liberdade versus Determinismo
(Esqueletos que pensava enterrados)
(Esqueletos que pensava enterrados)
Hoje vou polemizar convosco; vou, pela primeira vez, vestir o hábito de "Cardeal Diabo" e "espremer" cada ideia, cada conceito dos vossos comentários.
“... um homem quando nasce é constituído por um hardware e por um software próprios, que irão ter de lidar com a vida que se lhe deparar ..." (JLM);
"... O Criador é isento de culpas" (Anónimo);
"... o subir o monte" (VAV).
Hipóteses:
1 - Será que o Cérebro humano se pode equivaler ao "hardware" de um computador (CPU), evoluindo ao sabor da ciência/tecnologia?
2 - Será que toda a nossa vida Cognitiva não passa de um "software", mais ou menos sofisticado, "parceiro" do conhecimento/tecnologia?
3 - Será que o Criador tem alguma "culpa"?
Se as premissas acima são válidas, onde se "encaixa", então, a vida Afetiva?
- E os SENTIMENTOS? Qual o seu "papel" e valor?
Temas interessantes, estes!... Curiosos, até!
Sendo eu um "fanático" da informática, procurando, sempre, o último grito da "tecnologia" no que diz respeito à "máquina" (hardware), com especial relevo para a "feitura" dos meus próprios programas (software)... aqui vai o que penso, relacionando o meu pensamento com a Filosofia (outra grande paixão da minha vida):
Tese:
O animal, pelo instinto, tende para o fim sem o conhecer.
Neste sentido, instinto é uma força ou tendência inata e específica que leva o animal à prática de certos atos úteis a si próprio e à espécie, sem que lhes "conheça" o fim ou a conveniência.
O HOMEM, pelo contrário, possui um poder superior - a INTELIGÊNCIA, mediante a qual conhece não só o fim para que tende, como também os meios adequados para o conseguir; à inteligência corresponde a vontade que procura o bem, não já o bem sensível, conhecido pelos sentidos, mas o bem moral, apreendido pela mesma inteligência.
É a inteligência que concebe e pondera os seus prós e contras, mas é a Afetividade que estimula a vontade a praticá-los, ou não.
O HOMEM, graças à sua inteligência, é capaz de sair de si mesmo e abarcar toda a realidade, trazendo-a para dentro de si, mediante as ideias.
E assim,
com o conhecimento das coisas, a pessoa vai adquirindo a consciência de si mesma.
Em face do universo, afirma-se como que um "EU", e isto porque
... CONHECE QUE EXISTE, PORQUE EXISTE E PARA QUE EXISTE!
A este "autoconhecimento" vem juntar-se o "autodomínio" ou a "independência" no atuar.
A pessoa não está sujeita às forças mecânicas do mundo físico, como as coisas, nem aos impulsos espontâneos e cegos dos instintos que dirigem os animais.
A pessoa conhece os fins do próprio ato e os meios que a eles conduzem; tem o poder de iniciativa e o domínio dos seus atos.
Esta riqueza indefinida como que apresenta à consciência o nosso mundo interior - é a multiplicidade da vida psíquica.
Todos os estados de consciência se referem a um "EU" uno e indivisível que, sustentando fenómenos diferentes, se reconhece como permanecendo idêntico a si mesmo debaixo da multiplicidade - é a unidade da vida psíquica.
A esta unidade, constituída por todos os factos psíquicos e atestada pela introspeção, dá-se em Psicologia, o nome de PERSONALIDADE.
Assim, a personalidade pode definir-se como a característica de um indivíduo que toma consciência de si mesmo e que é senhor dos seus atos - é como que a síntese unificadora da vida interior.
Daqui se conclui que para haver personalidade não basta a individualidade e a unidade; é, além disso, necessário o conhecimento dessa unidade.
Se examinarmos uma pessoa, ela aparece-nos como um indivíduo mas, assim, não atingimos ainda o que a pessoa tem de próprio e característico, pois indivíduos são também as plantas e os animais e ninguém lhes atribui personalidade.
A razão desta diferença está em que lhes falta a "consciência reflexiva" ou a razão, pela qual possam tomar conhecimento de si mesmos e conhecerem-se como um todo uno e individual.
Logo, o que nos coloca acima dos indivíduos e nos confere a dignidade de pessoas, é a RAZÃO.
É de facto pela dignidade de seres racionais que ultrapassamos o reino dos indivíduos e das coisas para nos elevarmos a uma existência singular no Universo.
Os animais e as plantas encontram-se fechados em si mesmos.
Os animais, em que já aparecem as primeiras manifestações de psiquismo, estão ligados aos destinos da espécie por instintos fatais.
O homem, pelo contrário, graças à inteligência, consegue ter ideias, saindo, assim, de si mesmo.
Neste sentido,
a personalidade é uma síntese de fenómenos psíquicos com o "eu", formando uma espécie de sistema.
É necessário que o HOMEM - "esse desconhecido", como lhe chamou Alexis Carrel - se "conheça cada vez melhor"; conheça as suas possibilidades, as suas energias internas, os seus sentimentos e paixões, a luz da sua inteligência, o calor da sua afetividade, a força da sua vontade - numa palavra, toda a sua atividade espiritual, para marcar bem o seu lugar na escala dos seres da Criação, saber quais são as suas possibilidades, o que de facto é e, assim, poder aperfeiçoar-se com vista a tornar-se o que deve ser.
Assim,
1. Será que o Homem é um ser livre, porque autodeterminado, ou pelo contrário,
2. Será que o Homem é um ser não livre, porque prédeterminado?
Todas as doutrinas que negam à vontade a propriedade de ser livre, e ensinam que o homem é, em todos os seus atos, determinado invencivelmente por influências exteriores ou interiores, têm o nome de DETERMINISMO.
Há, assim, os que entendem que todas as ações humanas são "evoluções espontâneas e necessárias de Deus".
É o chamado "Determinismo Panteísta", defendido por Espinosa, quando afirma que "a liberdade só convém a Deus" e que "os nossos atos não são nossos, mas do Ente Absoluto".
Outros há, como Santo Agostinho, que defendem que a vontade humana é determinada por Deus.
"Sendo Deus omnisciente, conhece e prevê todos os atos do homem. Ora o que Deus prevê acontece necessariamente; pois de contrário, enganar-se-ia".
Assim, para esta corrente (Determinismo Teológico) os atos humanos acontecem necessariamente e o homem não é livre.
A par destas duas correntes filosóficas, há, ainda, uma terceira - o "Determinismo Fatalista" - o qual reveste duas formas: o "Fatalismo Metafísico e Religioso" e o "Fatalismo Vulgar".
O primeiro explica as nossas ações e todos os conhecimentos do universo por uma "causa única e sobrenatural"; o segundo sustenta que, "como todos os acontecimentos do universo, a vontade é determinada nas suas ações pelo "destino" ou "fatum".
("Se está determinado pelo destino que hei de ser um filósofo, não necessito estudar filosofia porque o serei sem isso; se, ao contrário, está destinado que o não serei, é inútil o estudo, porque nunca o conseguirei" - quem não conhece este silogismo?!).
A par destes determinismos, há, ainda, os chamados "Determinismos da Razão".
Uma das teorias defende o "Determinismo Mecânico ou Fisiológico", segundo o qual a nossa vontade é dirigida por leis mecânicas e as suas operações são atos meramente reflexos.
A sua base de apoio é o materialismo.
Os autores desta teoria fundam-se em estatísticas que nos dão a conhecer, por exemplo, que o número de suicídios cometidos durante um ano é mais ou menos o mesmo para todos os anos, ou que o número de cartas dirigidas sem direção é também mais ou menos constante, omitindo que as estatísticas determinam médias e não casos particulares.
De acordo com esta teoria seria este ou aquele indivíduo obrigado a suicidar-se ou a enviar uma carta não endereçada para perfazer o número previsto? Certamente que não.
Uma outra doutrina, o "Determinismo Psicológico", afirma que a nossa atividade voluntária é determinada pelos motivos mais fortes; é como uma balança que se inclina sempre para o lado do peso maior.
Este determinismo pode apresentar dois aspetos: o "Determinismo Psicológico Vulgar" que suprime totalmente a liberdade, e o "Determinismo Psicológico de Leibniz" que salvaguarda a liberdade, pois que ela é o poder de atuar segundo a razão.
"Como podemos conciliar o valor dos nossos motivos com a liberdade?" pergunta Leibniz, e responde: "esta questão é difícil, pois que, se a liberdade consistisse em nos decidirmos sem motivos, o ato livre não seria racional e desceríamos à condição de animais; se, ao contrário, nos determinarmos por um motivo mais forte, parece que não somos livres".
Com base nestes pressupostos, o que é ser livre?
- Para alguns, ser livre "não é operar sem motivos ou contra os motivos propostos, avaliados e aprovados pela própria razão".
- Para a maioria (nos quais me incluo),
" a grande função da liberdade, será, enfim, a de elevar o homem da ordem sensível ao bem moral; é levá-lo a viver conforme a razão".
É na posse de um princípio ativo superior - a vontade livre - que a pessoa contrói o seu destino, através de caminhos originais, não contidos no determinismo da natureza dos instintos, e é o seu conhecimento que lhe dá o sentimento da responsabilidade, pela convicção de que somos nós próprios os autores dos nosso atos e os seus verdadeiros senhores.
LAHR afirmava serem três as prerrogativas da pessoa:
- CONHECER-SE
- POSSUIR-SE
- GOVERNAR-SE
Os indivíduos infra-humanos têm como fim servirem de meio; ao contrário, a pessoa possui um destino que é exclusivamente seu e sente capacidade para o prosseguir, exigindo o que para tal é indispensável, isto é, é um sujeito de DIREITOS... é um sujeito LIVRE!
- É a liberdade que permite ao homem, como homem que é, não estar sujeito às forças mecânicas das leis físicas e ao impulso fatal dos instintos;
- É a liberdade que dá ao homem a iniciativa e domínio dos seus atos;
- É a liberdade a grande prerrogativa da pessoa, a base da sua dignidade e o fundamento do seu valor.
Etimologicamente, a palavra liberdade significa isenção de um vínculo ou negação da determinação pura para uma só coisa, definindo-se em geral como o poder fazer ou deixar de fazer alguma coisa.
Neste sentido, ser livre é PODER FAZER, e por isso, sob este ponto de vista, há tantas espécies de liberdade quantas são as formas de atividade.
Assim, teremos:
- a liberdade física que significa estar isento de toda a coação ou obstáculo que nos possa impedir o exercício da nossa atividade física - o preso não tem liberdade física;
- a liberdade civil que consiste no reconhecimento pelas leis da nossa possibilidade de ação, dentro dos limites estabelecidos e exigidos pela ordem social - o escravo não tem liberdade civil;
- a liberdade política, de religião, de imprensa, etc.. Todas estas liberdades afetam a execução da vontade e significam poder fazer ou não fazer; são exteriores, podendo ser dadas ou suspensas por agentes externos.
A liberdade moral ou liberdade psicológica afeta a decisão e significa querer ou não querer; é uma auto determinação, é intrínseca e constitui uma propriedade da vontade, deliberando, decidindo por sua própria iniciativa.
A sua existência é independente de qualquer força exterior e interior.
A liberdade moral ou psicológica pode, assim, definir-se como sendo o poder que tem a vontade de se determinar por si mesma a uma coisa ou a outra, a querer fazer ou não uma coisa, ou a querer fazer antes uma do que a outra, independentemente de qualquer força extrínseca ou intrínseca.
Esta liberdade não é o mesmo que poder fazer mal; tal poder provem de abuso da liberdade.
O Ser é tanto mais livre, quanto mais se liberta das suas más inclinações e fielmente cumpre o seu dever.
A existência da liberdade no homem verifica-se pela análise introspetiva do ato voluntário, nas suas diferentes fases.
Esta análise constitui o "argumento direto da consciência".
Enquanto DELIBERAMOS, temos plena consciência de que aqueles atos dos quais refletimos, não nos arrastam, necessariamente, para serem eleitos.
Temos consciência de poder dominar os motivos e os móbeis que nos solicitam, abreviar ou prolongar o exame, fomentar ou não a decisão.
Quando pomos fim à deliberação e nos DECIDIMOS a eleger uma parte da alternativa, temos plena consciência de o fazermos unicamente porque queremos e não porque a isso fomos arrastados irresistivelmente pelo objeto.
Estamos plenamente conscientes de escolher, entre os dois atos um, mas de maneira que pudéssemos eleger também o outro, se quiséssemos.
Durante a EXECUÇÃO, a consciência atesta-nos que podíamos voltar atrás, anular a decisão e recomeçar a deliberação.
Se o homem não fosse livre, não seria fácil explicar alguns factos observados pela consciência, como, por exemplo ,
- refletirmos acerca de atos que nos são propostos para eleger;
- atribuirmos a nós próprios ações dignas de mérito ou castigo;
- sentirmo-nos capazes de ser regidos por leis.
A LIBERDADE é, assim, também, o fundamento necessário da ordem moral e, por via disso, indispensável para o homem poder levar uma vida digna de si e da sociedade humana.
Com efeito, negada a liberdade, deixam de existir ações moralmente boas ou más, deixa de existir a obrigação e o direito, a responsabilidade e a sanção e, por conseguinte, o motivo para evitar as ações más e o estímulo das boas, isto é, deixa de existir toda a vida moral.
De facto, a moral exprime o dever de ser do homem em relação ao seu fim último.
Ora a imposição de um dever supõe a possibilidade de se poder ser diferente daquilo que se deve ser, isto é, supõe LIBERDADE.
Mas é pela INTELIGÊNCIA que a pessoa se conhece como algo de superior a todos os restantes seres do universos; que tem uma função nobre a cumprir...
A LIBERDADE não é um meio para a realização de um fim diferente de si mesma, mas ela própria é o seu seu fim... que realiza por si mesma.
Carlos Fiúza
P.S. Estou ciente do "Erro de Descartes" (António Damásio)... como ciente estou da evolução da neurociência ("Como Decidimos"-Jonah Lehrer).
Aceito as bases científicas do determinismo biológico (ADN, por exemplo)... mas tão só).
Não aceito que o poder "sonhar" seja uma "determinação" exterior a mim!
“... um homem quando nasce é constituído por um hardware e por um software próprios, que irão ter de lidar com a vida que se lhe deparar ..." (JLM);
"... O Criador é isento de culpas" (Anónimo);
"... o subir o monte" (VAV).
Hipóteses:
1 - Será que o Cérebro humano se pode equivaler ao "hardware" de um computador (CPU), evoluindo ao sabor da ciência/tecnologia?
2 - Será que toda a nossa vida Cognitiva não passa de um "software", mais ou menos sofisticado, "parceiro" do conhecimento/tecnologia?
3 - Será que o Criador tem alguma "culpa"?
Se as premissas acima são válidas, onde se "encaixa", então, a vida Afetiva?
- E os SENTIMENTOS? Qual o seu "papel" e valor?
Temas interessantes, estes!... Curiosos, até!
Sendo eu um "fanático" da informática, procurando, sempre, o último grito da "tecnologia" no que diz respeito à "máquina" (hardware), com especial relevo para a "feitura" dos meus próprios programas (software)... aqui vai o que penso, relacionando o meu pensamento com a Filosofia (outra grande paixão da minha vida):
Tese:
O animal, pelo instinto, tende para o fim sem o conhecer.
Neste sentido, instinto é uma força ou tendência inata e específica que leva o animal à prática de certos atos úteis a si próprio e à espécie, sem que lhes "conheça" o fim ou a conveniência.
O HOMEM, pelo contrário, possui um poder superior - a INTELIGÊNCIA, mediante a qual conhece não só o fim para que tende, como também os meios adequados para o conseguir; à inteligência corresponde a vontade que procura o bem, não já o bem sensível, conhecido pelos sentidos, mas o bem moral, apreendido pela mesma inteligência.
É a inteligência que concebe e pondera os seus prós e contras, mas é a Afetividade que estimula a vontade a praticá-los, ou não.
O HOMEM, graças à sua inteligência, é capaz de sair de si mesmo e abarcar toda a realidade, trazendo-a para dentro de si, mediante as ideias.
E assim,
com o conhecimento das coisas, a pessoa vai adquirindo a consciência de si mesma.
Em face do universo, afirma-se como que um "EU", e isto porque
... CONHECE QUE EXISTE, PORQUE EXISTE E PARA QUE EXISTE!
A este "autoconhecimento" vem juntar-se o "autodomínio" ou a "independência" no atuar.
A pessoa não está sujeita às forças mecânicas do mundo físico, como as coisas, nem aos impulsos espontâneos e cegos dos instintos que dirigem os animais.
A pessoa conhece os fins do próprio ato e os meios que a eles conduzem; tem o poder de iniciativa e o domínio dos seus atos.
Esta riqueza indefinida como que apresenta à consciência o nosso mundo interior - é a multiplicidade da vida psíquica.
Todos os estados de consciência se referem a um "EU" uno e indivisível que, sustentando fenómenos diferentes, se reconhece como permanecendo idêntico a si mesmo debaixo da multiplicidade - é a unidade da vida psíquica.
A esta unidade, constituída por todos os factos psíquicos e atestada pela introspeção, dá-se em Psicologia, o nome de PERSONALIDADE.
Assim, a personalidade pode definir-se como a característica de um indivíduo que toma consciência de si mesmo e que é senhor dos seus atos - é como que a síntese unificadora da vida interior.
Daqui se conclui que para haver personalidade não basta a individualidade e a unidade; é, além disso, necessário o conhecimento dessa unidade.
Se examinarmos uma pessoa, ela aparece-nos como um indivíduo mas, assim, não atingimos ainda o que a pessoa tem de próprio e característico, pois indivíduos são também as plantas e os animais e ninguém lhes atribui personalidade.
A razão desta diferença está em que lhes falta a "consciência reflexiva" ou a razão, pela qual possam tomar conhecimento de si mesmos e conhecerem-se como um todo uno e individual.
Logo, o que nos coloca acima dos indivíduos e nos confere a dignidade de pessoas, é a RAZÃO.
É de facto pela dignidade de seres racionais que ultrapassamos o reino dos indivíduos e das coisas para nos elevarmos a uma existência singular no Universo.
Os animais e as plantas encontram-se fechados em si mesmos.
Os animais, em que já aparecem as primeiras manifestações de psiquismo, estão ligados aos destinos da espécie por instintos fatais.
O homem, pelo contrário, graças à inteligência, consegue ter ideias, saindo, assim, de si mesmo.
Neste sentido,
a personalidade é uma síntese de fenómenos psíquicos com o "eu", formando uma espécie de sistema.
É necessário que o HOMEM - "esse desconhecido", como lhe chamou Alexis Carrel - se "conheça cada vez melhor"; conheça as suas possibilidades, as suas energias internas, os seus sentimentos e paixões, a luz da sua inteligência, o calor da sua afetividade, a força da sua vontade - numa palavra, toda a sua atividade espiritual, para marcar bem o seu lugar na escala dos seres da Criação, saber quais são as suas possibilidades, o que de facto é e, assim, poder aperfeiçoar-se com vista a tornar-se o que deve ser.
Assim,
1. Será que o Homem é um ser livre, porque autodeterminado, ou pelo contrário,
2. Será que o Homem é um ser não livre, porque prédeterminado?
Todas as doutrinas que negam à vontade a propriedade de ser livre, e ensinam que o homem é, em todos os seus atos, determinado invencivelmente por influências exteriores ou interiores, têm o nome de DETERMINISMO.
Há, assim, os que entendem que todas as ações humanas são "evoluções espontâneas e necessárias de Deus".
É o chamado "Determinismo Panteísta", defendido por Espinosa, quando afirma que "a liberdade só convém a Deus" e que "os nossos atos não são nossos, mas do Ente Absoluto".
Outros há, como Santo Agostinho, que defendem que a vontade humana é determinada por Deus.
"Sendo Deus omnisciente, conhece e prevê todos os atos do homem. Ora o que Deus prevê acontece necessariamente; pois de contrário, enganar-se-ia".
Assim, para esta corrente (Determinismo Teológico) os atos humanos acontecem necessariamente e o homem não é livre.
A par destas duas correntes filosóficas, há, ainda, uma terceira - o "Determinismo Fatalista" - o qual reveste duas formas: o "Fatalismo Metafísico e Religioso" e o "Fatalismo Vulgar".
O primeiro explica as nossas ações e todos os conhecimentos do universo por uma "causa única e sobrenatural"; o segundo sustenta que, "como todos os acontecimentos do universo, a vontade é determinada nas suas ações pelo "destino" ou "fatum".
("Se está determinado pelo destino que hei de ser um filósofo, não necessito estudar filosofia porque o serei sem isso; se, ao contrário, está destinado que o não serei, é inútil o estudo, porque nunca o conseguirei" - quem não conhece este silogismo?!).
A par destes determinismos, há, ainda, os chamados "Determinismos da Razão".
Uma das teorias defende o "Determinismo Mecânico ou Fisiológico", segundo o qual a nossa vontade é dirigida por leis mecânicas e as suas operações são atos meramente reflexos.
A sua base de apoio é o materialismo.
Os autores desta teoria fundam-se em estatísticas que nos dão a conhecer, por exemplo, que o número de suicídios cometidos durante um ano é mais ou menos o mesmo para todos os anos, ou que o número de cartas dirigidas sem direção é também mais ou menos constante, omitindo que as estatísticas determinam médias e não casos particulares.
De acordo com esta teoria seria este ou aquele indivíduo obrigado a suicidar-se ou a enviar uma carta não endereçada para perfazer o número previsto? Certamente que não.
Uma outra doutrina, o "Determinismo Psicológico", afirma que a nossa atividade voluntária é determinada pelos motivos mais fortes; é como uma balança que se inclina sempre para o lado do peso maior.
Este determinismo pode apresentar dois aspetos: o "Determinismo Psicológico Vulgar" que suprime totalmente a liberdade, e o "Determinismo Psicológico de Leibniz" que salvaguarda a liberdade, pois que ela é o poder de atuar segundo a razão.
"Como podemos conciliar o valor dos nossos motivos com a liberdade?" pergunta Leibniz, e responde: "esta questão é difícil, pois que, se a liberdade consistisse em nos decidirmos sem motivos, o ato livre não seria racional e desceríamos à condição de animais; se, ao contrário, nos determinarmos por um motivo mais forte, parece que não somos livres".
Com base nestes pressupostos, o que é ser livre?
- Para alguns, ser livre "não é operar sem motivos ou contra os motivos propostos, avaliados e aprovados pela própria razão".
- Para a maioria (nos quais me incluo),
" a grande função da liberdade, será, enfim, a de elevar o homem da ordem sensível ao bem moral; é levá-lo a viver conforme a razão".
É na posse de um princípio ativo superior - a vontade livre - que a pessoa contrói o seu destino, através de caminhos originais, não contidos no determinismo da natureza dos instintos, e é o seu conhecimento que lhe dá o sentimento da responsabilidade, pela convicção de que somos nós próprios os autores dos nosso atos e os seus verdadeiros senhores.
LAHR afirmava serem três as prerrogativas da pessoa:
- CONHECER-SE
- POSSUIR-SE
- GOVERNAR-SE
Os indivíduos infra-humanos têm como fim servirem de meio; ao contrário, a pessoa possui um destino que é exclusivamente seu e sente capacidade para o prosseguir, exigindo o que para tal é indispensável, isto é, é um sujeito de DIREITOS... é um sujeito LIVRE!
- É a liberdade que permite ao homem, como homem que é, não estar sujeito às forças mecânicas das leis físicas e ao impulso fatal dos instintos;
- É a liberdade que dá ao homem a iniciativa e domínio dos seus atos;
- É a liberdade a grande prerrogativa da pessoa, a base da sua dignidade e o fundamento do seu valor.
Etimologicamente, a palavra liberdade significa isenção de um vínculo ou negação da determinação pura para uma só coisa, definindo-se em geral como o poder fazer ou deixar de fazer alguma coisa.
Neste sentido, ser livre é PODER FAZER, e por isso, sob este ponto de vista, há tantas espécies de liberdade quantas são as formas de atividade.
Assim, teremos:
- a liberdade física que significa estar isento de toda a coação ou obstáculo que nos possa impedir o exercício da nossa atividade física - o preso não tem liberdade física;
- a liberdade civil que consiste no reconhecimento pelas leis da nossa possibilidade de ação, dentro dos limites estabelecidos e exigidos pela ordem social - o escravo não tem liberdade civil;
- a liberdade política, de religião, de imprensa, etc.. Todas estas liberdades afetam a execução da vontade e significam poder fazer ou não fazer; são exteriores, podendo ser dadas ou suspensas por agentes externos.
A liberdade moral ou liberdade psicológica afeta a decisão e significa querer ou não querer; é uma auto determinação, é intrínseca e constitui uma propriedade da vontade, deliberando, decidindo por sua própria iniciativa.
A sua existência é independente de qualquer força exterior e interior.
A liberdade moral ou psicológica pode, assim, definir-se como sendo o poder que tem a vontade de se determinar por si mesma a uma coisa ou a outra, a querer fazer ou não uma coisa, ou a querer fazer antes uma do que a outra, independentemente de qualquer força extrínseca ou intrínseca.
Esta liberdade não é o mesmo que poder fazer mal; tal poder provem de abuso da liberdade.
O Ser é tanto mais livre, quanto mais se liberta das suas más inclinações e fielmente cumpre o seu dever.
A existência da liberdade no homem verifica-se pela análise introspetiva do ato voluntário, nas suas diferentes fases.
Esta análise constitui o "argumento direto da consciência".
Enquanto DELIBERAMOS, temos plena consciência de que aqueles atos dos quais refletimos, não nos arrastam, necessariamente, para serem eleitos.
Temos consciência de poder dominar os motivos e os móbeis que nos solicitam, abreviar ou prolongar o exame, fomentar ou não a decisão.
Quando pomos fim à deliberação e nos DECIDIMOS a eleger uma parte da alternativa, temos plena consciência de o fazermos unicamente porque queremos e não porque a isso fomos arrastados irresistivelmente pelo objeto.
Estamos plenamente conscientes de escolher, entre os dois atos um, mas de maneira que pudéssemos eleger também o outro, se quiséssemos.
Durante a EXECUÇÃO, a consciência atesta-nos que podíamos voltar atrás, anular a decisão e recomeçar a deliberação.
Se o homem não fosse livre, não seria fácil explicar alguns factos observados pela consciência, como, por exemplo ,
- refletirmos acerca de atos que nos são propostos para eleger;
- atribuirmos a nós próprios ações dignas de mérito ou castigo;
- sentirmo-nos capazes de ser regidos por leis.
A LIBERDADE é, assim, também, o fundamento necessário da ordem moral e, por via disso, indispensável para o homem poder levar uma vida digna de si e da sociedade humana.
Com efeito, negada a liberdade, deixam de existir ações moralmente boas ou más, deixa de existir a obrigação e o direito, a responsabilidade e a sanção e, por conseguinte, o motivo para evitar as ações más e o estímulo das boas, isto é, deixa de existir toda a vida moral.
De facto, a moral exprime o dever de ser do homem em relação ao seu fim último.
Ora a imposição de um dever supõe a possibilidade de se poder ser diferente daquilo que se deve ser, isto é, supõe LIBERDADE.
Mas é pela INTELIGÊNCIA que a pessoa se conhece como algo de superior a todos os restantes seres do universos; que tem uma função nobre a cumprir...
A LIBERDADE não é um meio para a realização de um fim diferente de si mesma, mas ela própria é o seu seu fim... que realiza por si mesma.
Carlos Fiúza
P.S. Estou ciente do "Erro de Descartes" (António Damásio)... como ciente estou da evolução da neurociência ("Como Decidimos"-Jonah Lehrer).
Aceito as bases científicas do determinismo biológico (ADN, por exemplo)... mas tão só).
Não aceito que o poder "sonhar" seja uma "determinação" exterior a mim!
3 comentários:
SR Carlos Fiúza
Gosto imenso dos seus textos e sobretudo da forma como consegue transformar... doutrinas filosóficas .. sempre complicadas e fastidiosas para o cidadão comum, como eu, em mensagens fácilmente perceptíveis e agradáveis
hesitei um pouco .. comento? Mão comento?.. Este não é o meu campo.. embora me seduza ..
por esta razão e por.. cito do seu texto
" a grande função da liberdade, será, enfim, a de elevar o homem da ordem sensível ao bem moral; é levá-lo a viver conforme a razão".
permita-me que lhe coloque algumas questões agradecendo , desde já, a sua opinião.
No meu 7º Ano (3º ciclo dos liceus), já lá vão uns anos.. a definição de Filosofia, ainda me recordo (assim como da tabuada) era:
etimológicamente
Philos + sofia= amigos da sabedoria
ou a definição para exame:
" A ciencia do espírito do homem e de tudo aquilo que esse espírito é capaz de conceber e criar , para além do domínio sensível( Foulquié)
mas já havia quem tivesse opiniões diferentes e criasse "correntes contrárias
Philos + sofia . era os amigos da Sofia (lóren)
e
a outra definição era
Filosofia .. é a ciencia com a qual e sem a qual ... tudo fica tal e qual !!!
Havia quem acreditasse que a máquina dominaria o Homem que a criou e quem defendesse que como a máquina foi criada pelo Homem ele também a destruiria pois a máquina só servia para o ajudar a atingir a perfeição e a aproximar-se do Criador
Isto nos anos 60
Em 2010 ... confirma-se que realmente os amigos da Sofia Lóren.. tinham razão.... Juntara-se todos ainda há pouco num evento cultural no Douro
e pelo seu texto verifico que
1- A máquina domina o homem.. pois
O Homem já nasce com Hardware e software..possívelmente Microsoft,
montado em Vila do Conde por JP Sá
Couto, designado por Magalhães, com pouca autonomia e cujo criador é Sócrates ... não o Filósofo do só sei que nada sei .mas. o outro que sabe que sabe tudo
e para defender que Deus está isento de culpa... aparece , muito comprometido, um anónimo... lá do fundo.
Questão que gostaria de colocar.
que aconteceu à Filosofia .. dos anos 60 até hoje.?..
Qual a evolução do Homem e da sua relação com o meio? tanbém dos anos 60 até hoje
Que perspectivas futuras
Obrigado
mario carvalho
O “Ser” e o “Eu”
Caro Mário Carvalho
“Comento? Não comento?”, assim (quase) começou o meu Amigo a sua intervenção.
No entanto, e porque é um homem LIVRE, elegeu uma parte da alternativa: COMENTAR.
Em boa hora a sua inteligência se socorreu da análise introspectiva do ato voluntário, colocando-nos questões bem prementes e actuais.
Avançámos assim tanto desde os seus (e meus) anos 60?
Conhece-se o homem hoje mais do que nessa época? Sem dúvida… mas conhece-se melhor?
No dizer de Aristóteles, saber não é só saber mais, mas, sobretudo, saber melhor.
E o que sabemos (hoje) sobre o Homem?
O que é este SER?
Emanação divina ou um conjunto de fenómenos físico-químicos?
A resposta está fora de mim… “só sei que nada sei”!
O que mais se aproxima de uma "explicação" encontramo-la na Ontologia, isto é na ciência que estuda o ser em geral, ou do ser enquanto ser (não dos seres particulares que encontramos à nossa volta, mas do ser abstrato, que se encontra concretizado em todos os seres vivos).
É a ideia mais abstrata de todas e, ao conhecê-la, alcançamos o mais alto grau de abstração.
Ao ser opõe-se o nada, que é a negação do ser.
Para o senso comum, a verdadeira realidade é o que existe fora do pensamento (por exemplo, o computador que estou a utilizar).
Mas este pensamento envolve já uma certa realidade e não uma simples possibilidade - envolve uma existência e não apenas uma essência.
De facto, quando penso em triângulo, dou à essência do triângulo uma realização mental. O pensamento é, assim, o primeiro grau da realidade, mas existir fora do pensamento é mais do que existir só no pensamento.
Mas ao ser não se pode acrescentar nada que nele não esteja contido, porque tudo aquilo que é, é SER!
Por exemplo, o barro é barro, mas não é tijolo… embora o possa vir a ser.
Em todo o ser concreto, por exemplo uma laranja, podemos distinguir dois pontos de vista: a essência, que faz que uma coisa seja o que é e a distingue de qualquer outro fruto; e a existência, que atualiza a essência e a realiza efetivamente.
E a ALMA?… Onde fica?...
Essa realidade, a que demos o nome de "EU", será a ALMA?
Assim como certos factos, verificados nos seres vivos e inexplicáveis pelas propriedades físico-químicas da matéria, nos levaram a admitir nesses seres um princípio superior à matéria, assim também, em virtude de observarmos alguns factos que o simples mecanismo orgânico não pode explicar, concluímos existir nele um princípio de atividade superior ao corpo, de natureza espiritual.
A consciência atesta-nos que toda a vida psíquica, com todos os fenómenos, se refere a um "EU".
Constará o homem, portanto, de alma e corpo?
Se assim for, esta dualidade traz consigo um novo problema: como é que duas realidades heterogéneas podem influir uma na outra?
Continuará a "alma" a viver porque, sendo imortal, não deixará de ser uma substância incompleta?
Mesmo deixando de exercer aquelas atividades que exigem o concurso direto do corpo (sensações)?
Haverá entre a alma e o corpo uma "união substancial" que consistirá na fusão de duas realidades incompletas para formar uma única substância composta?
Não haverá, antes, uma "união simplesmente acidental", tal como existe entre duas realidades completas que se unem espiritualmente (como o piloto ao avião ou o cavaleiro ao cavalo) e fora da união permanecem intactas?
Será esta a “imortalidade” que interessa ao homem?
Interessante, não?!...
Obrigado pela sua intervenção.
Cumprimentos
Carlos Fiúza
Caro Carlos Fiúza
Lamento só hoje agradecer a ajuda e a preocupação que colocou na resposta célere
Muito interessante.. e muito elucidativa ...
A Natureza seduz-nos e as tecnologias valem a pena quando temos oportunidade e o privilégio de conhecer pessoas como o Senhor
Obrigado
cumprimentos
mario carvalho
Ps. No local em que me encontro destroem as antigas tecnologias porque não são rentáveis e não se pode usufruir das novas porque... não são rentáveis..
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