quarta-feira, 27 de abril de 2011

Daqui e dali... Henrique Raposo

Igreja Universal do Reino de Sócrates

Caros amigos socialistas, estou eternamente grato à vossa igreja. Sinto-me um homem novo desde que fui ungido pela água benta que jorrava do vosso congresso. Aliás, posso dizer que sou um born again socialist. Sinto-me capaz de dobrar colheres com o meu novo olhar progressista. Sinto-me capaz de enfeitiçar serpentes com a minha flauta, qual marajá socialista. Por favor, enviem-me uma ficha de inscrição, porque eu quero ser um dos acólitos do nosso querido líder. Eu quero ser um mártir da guerra santa que temos pela frente contra a blasfémia inútil (BE e PCP) e contra a maldade em estado puro (a direita).

Meus caros irmãos na fé, como eu gostei de estar junto de vós! Gostei tanto de ver a forma como V. Exas. se curvam perante o nosso glorioso líder. Que humildade teológica! Que flexibilidade moral! Gostei tanto de ver como os meus amigos repetem ipsis verbis as declarações do grandioso líder. Que demonstração de fé! Gostei tanto de ver a forma como choram ao som das músicas mais pindéricas do mundo. Caramba, eu também quero chorar assim! Gostei tanto de ver o nosso glorioso líder a dar encontrões em jornalistas que só fazem perguntas para incomodar. Esta gente tem de aprender o significado da expressão "
liberdade respeitosa", a grande contribuição do nosso secretário-geral para a história da democracia. Gostei tanto de ver a formação do cordão higiénico anti-fotógrafos. Afinal de contas, esses tipos não passam de paparazzi. Como se atrevem a tentar apanhar os ângulos maus do nosso glorioso líder? Como se atrevem a desrespeitar o Luís? Gostei tanto de ver os seguranças do nosso glorioso líder a empurrar violentamente os repórteres de imagem. Que demonstração de lealdade! Foi como ver a falange de Leónidas ante uns persas de câmara ao ombro. E, caramba, como foi bom ver que os jornalistas já encaram tudo isto com normalidade. Já nem ligam. Estão cansados. É assim mesmo camaradas: vamos vencê-los pelo cansaço.

Caros patrícios socialistas, como foi bom estar ali na corte do nosso czar cor-de-rosa! Como eu gostei de sentir aquelas longas salvas de palmas. Como foi bom ver que ninguém queria ser o primeiro a deixar de bater palmas. Como foi bom ver que essas palmas afugentavam as calúnias nojentas que circulavam (e que circulam) fora do partido. Sim, sim: lá fora, pessoas más atrevem-se a dizer que o nosso líder levou o país à bancarrota. Meus deus, como podem existir pessoas tão mesquinhas? Será que não entendem que, sem o nosso querido líder, o país cairá num abismo? Será que esta gentinha não entende que nós somos os únicos capazes de defender Portugal? E sabem o que é pior, meus irmãos? Esta gentinha atreve-se a dizer que o PS governou Portugal nos últimos 16 anos, tentando assim responsabilizar-nos pelo estado do país. Que ultraje. Que infâmia. Ora, e mesmo que o PS tivesse governado o país nos últimos 16 anos, o que seria isso ao pé da Fonte Luminosa? O que seria isso ao pé do Mário Soares de 1976? O que seria 1995-2011 perante este passado glorioso? O que seria 2005-2011 ao pé da derrota da PIDE em 1974 e da derrota do comunismo em 1976? Meus amigos, há que manter esta elevação de espírito, e proclamar o seguinte: é irrelevante estudar os efeitos concretos do socialismo aqui no presente, porque o PS só precisa de invocar a bondade intrínseca do socialismo do passado.

Camaradas (já me permitem esta intimidade?), como foi bom aprender a suspender o raciocínio. Como foi bom aprender que "
a crise de 1929 não foi tão grave como esta que estamos a viver" (Almeida Santos). Ó camaradas, obrigado por me ensinarem a dizer estas coisas sem corar. Obrigado por me ensinarem a sentir-me virtuoso mesmo quando me limito a cuspir intolerância. Sim, porque a Direita não é outra forma possível de ver as coisas. Nada dessas frescuras! A Direita é perversa e "quer fazer maldades". Sinto-me envergonhado por não ter percebido isso mais cedo. Muito, muito obrigado por esta pedagogia política. E, agora, se não se importam, enviem-me para o jornal uma ficha de inscrição desta nossa Igreja Universal do Reino de Sócrates. Este born again socialist agradece, desde já, esse gesto simpático. Expresso

1 comentário:

Anónimo disse...

Sócratas não consegue é dizer a palavra errei, como muitos benfiquistas não conseguem dizer a palavra perdi. Foi a arbitragem do FMI, foram os fiscais de linha da Oposição. A culpa é sempre dos outros. E não do sistema de favores que ele próprio implementou.
O Alter-Socas do Pei Esse